O audacioso sobrevoo da Hera por Marte: um grande passo em frente

Aqui estamos novamente, no aeroporto de Frankfurt, após mais um marco bem-sucedido da missão Hera. Ontem, por volta do meio-dia, a Hera realizou um sobrevoo sobre Marte — o que significa que “roubou” parte da energia gravitacional do planeta para receber um impulso rumo ao seu destino final: Didymos. Esta técnica, comum na exploração espacial, permite reduzir de forma significativa a quantidade de propulsor necessária a bordo. Na verdade, a Hera ganhou um impulso adicional de quase 1 km/s — o equivalente a toda a sua reserva de combustível.
Mas isso não foi tudo. Como o sistema GNC estava a funcionar corretamente e a navegação autónoma com tecnologias de centroides já tinha sido executada com sucesso logo no dia seguinte ao LEOP, o objetivo passou a ser mais ambicioso: testar uma técnica completamente experimental chamada feature tracking, com Marte como alvo. A GMV implementou este algoritmo com uma prioridade baixa, dado o calendário apertado da missão e a necessidade de definir bem as prioridades. O plano era apenas ativá-lo depois de cumprido o objetivo principal da missão. Mas arriscámos… e conseguimos!
A maior preocupação na sala de controlo da ESOC, em Darmstadt, na Alemanha, era que o teste pudesse ativar um modo de segurança, o que comprometeria a recolha de dados científicos durante o sobrevoo de Marte. No entanto, testar esta tecnologia daria uma flexibilidade extra à navegação de proximidade quando a Hera se aproximar dos asteroides. Como sempre, tratou-se de encontrar o equilíbrio certo. Mas temos de confiar no nosso sistema, sabendo que estamos prestes a enfrentar um ambiente desconhecido — um sistema binário de asteroides — e que teremos muito pouco tempo para reagir ao inesperado. Por isso, tomámos a decisão: luz verde para o feature tracking em Marte.
Estivemos lá, lado a lado com Brian May, dos Queen — que tem apoiado a missão desde o início, não só por ser um guitarrista extraordinário, mas também um brilhante cientista — a olhar para um ecrã onde, às 16h05 de 12 de março, deveríamos receber um sinal da nave. Mas passaram segundos… depois minutos… e nada. Felizmente, tratava-se apenas de um monitor congelado que atrasou a boa notícia: a Hera estava viva, não ativou o modo de segurança e tudo estava a correr bem.
Recebemos imagens impressionantes de Marte e das suas luas, como nunca antes tinham sido vistas. Agora, seguimos para a análise detalhada dos resultados do feature tracking. Ainda assim, já podemos afirmar: foi um êxito. O desempenho não era o objetivo principal, uma vez que esta tecnologia foi pensada para operações de proximidade — como aterragens na Lua ou navegação junto a asteroides — e não para um sobrevoo rápido de um planeta. Sabemos que foram identificadas características em Marte, que essas características foram seguidas entre imagens, e que o filtro de navegação as utilizou para melhorar a estimativa de estado da sonda.
Mais um marco. Mais um êxito para a Hera, que volta a demonstrar o potencial das missões da chamada Next Space.
Daqui a um ano, realizaremos uma nova manobra no espaço profundo e, seis meses depois, começará a fase mais emocionante da missão: a aproximação a um sistema binário de asteroides que a humanidade já modificou — e sobre o qual ainda temos tantas perguntas por responder. A mais importante talvez seja esta: estaremos preparados para defender a Terra se algo semelhante ao que aconteceu aos dinossauros voltar a repetir-se?
Uma última palavra para a equipa da Hera: simplesmente incrível. Vocês são o verdadeiro coração desta missão. Obrigado a todos!
Autor: Andrea Pellacani